sábado, 22 de junho de 2013

A Hora da Verdade





Gracinda ficou na plataforma  de trem aproximadamente  uma hora e meia, resolvendo se embarcava ou não.Não estava ainda bem certa quando  seus ouvidos  captaram  um diálogo  que  descrevia uma situação parecida com a sua:  Mas mãe, o pai era pra ter chegado faz muito tempo atrás.Vamos pra casa, estou cansada e não acredito mais que ele venha. Ele já fez isso antes vezes demais para você  ainda acreditar que ele voltaria. Ele não volta mãe.Foi nesse momento que Gracinda sentiu  uma dor  no peito.Tinha medo de ir e não voltar mais.Seus filhos eram ainda tão pequenos, que lembranças afinal teriam dela. Entenderiam que isso era o melhor que poderia fazer? Mas  e ela , pensava assim também, via nesse gesto desesperado o melhor a fazer? Ir para outra cidade tentar melhores condições sempre estivera entre seus planos, mas  antes de ter seus filhos.Agora não sabia se iria aguentar...de saudades, de solidão, de culpa.
 Anos atrás, quando o pai lhe pedira para não casar com aquele homem, ficar um pouco mais com sua família e esperar por uma oportunidade melhor de casamento, ela simplesmente ignorou o pedido do pais e de seus irmãos e  se casou com o  sonhador Gastão, que tinha  uma plantação de macaxeira, do outro lado  do poço coletivo , na vila onde nascera  e vivera até então.Ninguém naquelas estalagens  tinha grandes sentimentos por ele.Sempre sovina, taciturno e  fedido.O que afinal, a mais bonita de suas filhas tinha visto  nesse homem, perguntava-se o pai.Depois do casamento na igreja de frente com a estação de trem,ele a viu partir, para irem para a capital.Deu nó na garganta e desejou poder chorar como a muito não fazia mais. A única coisa que o consolava, era a esperança de saber que Gracinda  de fato estaria melhor de vida, dada toda aquela propaganda  sobre aqueles que foram tentar a sorte na capital e depois de pouco mais de um ano, já voltavam para buscar o restante da família.
Cinco anos haviam  passado e  ela viúva, lavava roupa para  a metade do mundo e cozinhava para a outra  metade...Não tinha  o seu próprio lugar para  morar com os filhos , a única coisa que o  marido  lhe deixou  de bom.Não tinha  roupas decentes, não tinha comida o suficiente.Deixando de comer para alimentar os filhos  nunca se sentia  forte o bastante para trabalhar mais e assim era um circulo vicioso...Não conseguia se dar bem  em São Luis e nem conseguia voltar para a casa de seus pais em  São Pedro dos crentes.Foi nessa situação sofrida  que aceitou  a 'boa vontade ' de um vizinho caminhoneiro  que já lhe oferecia faz tempo  uma carona para a terra dos pais.Em todas as paradas tinha que descer e agradar o marmanjo de alguma forma.Quando chegou  na cidade, desceu e se pôs a caminhar os  seis quilômetros  que faltavam até a porta  de sua casa. Não queria  que aquele vigarista aproveitador  lhe aparecesse na porta  num dia de seu futuro. Seria então capaz  de mata-lo.Seus filhos chegaram quase mortos de fome e sede.Tudo o que conseguira de comer   durante a viagem , foi  repartido entre as crianças. 
Agora depois de um mês, estava ali, na mesma estação em que  havia idealizado grandes sonhos e tecido todas as suas esperanças.Seus filhos, deixados com os pais,estariam a salvo da fome.Na bolsa, dado de bom grado, as generosas economias do irmão mais velho.No coração, a dor da saudade já antecipando o pranto e o sofrimento da distância. Mas  ao olhar  para frente , não se sentia mais  como uma sonhadora.Agora era uma real experiência de trabalho em  Açailândia, uma das cidades mais promissoras de todo o Maranhão.Sobrevivia  da exportação de ferro vindos das cinco siderúrgicas ali instaladas.E favorecia a muitos que ali chegavam querendo trabalhar e mudar de vida.Sem que mesmo tentassem antes ir para a capital, como ela mesma já fizera uma vez. Estava indo  como cozinheira, indicada por um antigo  patrão de São Luis.E em breve  poderia juntar sua família e talvez até mesmo  melhorar o futuro de suas irmãs  ainda bem jovens. Só o que precisava era deixar os filhos  seguros.E nunca mais faria  barganhas com o diabo.Enxugando as lágrimas entrou no vagão do trem que a levaria  para a possibilidade de dias melhores, pensando   já na expectativa do reencontro com a família.Sorriu e não teve mais dúvidas.A esperança já lhe trazia  parte da felicidade que estava indo plantar.

Maura Nelle

Um comentário:

  1. Que lindo teu conto e bem emocionante.Uma história de vida realmente.ADOREI! beijos,chica

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Paz e Bem!
Maura Nelle